Há mais de dois anos que deixei
de ser um cliente assíduo do Facebook, por falta de tempo, muito trabalho e
pouca gente para o fazer, mas muito especialmente por falta de paciência para
ler comentários descabidos sobre todo o tipo de assuntos, noticias falsas,
insultos, discussões com argumentação completamente enviesada, erros e mais
erros, frases construídas a martelo. Poderia estar aqui a encher páginas
descrevendo todo o lixo que se encontra nesta rede social.
Nessa altura, era administrador
de vários grupos literários, fazendo a sua gestão e moderação diária e via mais
de metade do meu tempo gastar-se a avisar utilizadores que não cumpriam os
regulamentos dos grupos e a banir os reincidentes.
Comecei também a notar que uma grande
parte das publicações de textos e de poemas, não eram mais que ligações a
outras páginas ou grupos do mesmo tipo, que redireccionavam qualquer clique
para fora dos grupos que estava a gerir.
Como esta utilização não me
pareceu correcta, fiz alterações aos regulamentos de todos os grupos, inserindo
uma cláusula que proibia este tipo de publicação enganosa, que apenas se
destinava a aumentar o número de acessos e de cliques nas suas próprias páginas
e grupos.
Comecei a observar as pessoas que
o faziam e cheguei à conclusão que vários deles, chegavam a publicar o mesmo
texto ou poema em mais de setenta páginas, todas com a mesma intenção. Angariar
visitantes para a sua página. A partir desse momento, deixei de ter
contemplações. Rua, rua, rua, expulso, expulsa, fosse lá quem fosse.
Como sou informático e investigo
tudo o que me cheira a esturro, comecei a visitar assiduamente, as páginas do
pessoal que publicava textos nos meus grupos, e a analisar o tipo de aceitação
que tinham nas suas próprias páginas.
Ao fim de alguns meses, cheguei a
uma conclusão que me deixou boquiaberto. Foi essa conclusão que inspirou o
título deste escrito – “O martírio de quem escreve”.
Vou passar a citar os comentários
que uma grande maioria de amigos, seguidores e membros dos grupos de prosa e de
poesia, utilizam para manifestar o seu agrado e apreço, aos textos e poemas
publicados por escritores e poetas, frequentadores do FACEBOOK.
“Bom dia”, “Boa tarde”, “Boa
noite”, “Tenha uma boa semana”, “Beijinhos”, “Parabéns”, “Lindo”, “Lindo. Bom
dia”. Este tipo de comentários dirigem-se indiscriminadamente a homens e
mulheres e mostram bem que nenhum deles leu o que o “desgraçado” escreveu pois
não há nenhuma referência ao conteúdo.
Mas se nos debruçarmos com mais
atenção e analisarmos os comentários dirigidos a mulheres que escrevem,
verificamos que elas sofrem muito mais que eles (as que se importam, porque há
também muitas que não se importam).
Aqui ficam os mais comuns:
“Bom dia” mais um “LIKE”, “Bom
dia” mais um “Coraçãozinho Vermelho”, “Bom dia” mais um “Smile a mandar um
beijo”, o mesmo para o “Boa tarde” e para o “Boa noite”, o mesmo para “Tenha
uma boa semana”, muitos “Corações vermelhos”, muitas “Piscadelas de olho”, e
depois os comentários das “Amigas Cabras”, “HOJE estás linda” (ontem não
estava), “Como é que está o teu marido”, e o chorrilho continua, mais uma vez a
demonstrar o interesse dos comentadores no conteúdo do que foi escrito.
E se para mal da própria,
escritora ou poetisa, é gira ou gira e bem-feita, a todos os comentários
mencionados anteriormente e que se tornam neste caso muito mais frequentes, vem
os outros dos marmanjões do engate: “O poema liga muito bem com a foto da
autora - LINDA!”, “mp” (leia-se mensagem privada), “Gostava de falar consigo
Envio mensagem com número de telemóvel”; “Adorava conhecê-la pessoalmente.
Escreve muito bem”, etc., etc., etc..
Nesta altura eu digo cá para mim:
“Esta malta queima as pestanas a escrever para quê?”.
E eu? Estive aqui a escrever esta
merda, para quê?
Ah, já sei… para ler o primeiro
comentário que vai ser “Bom dia”.
(António Amaral)